Quanto custa entender o que é o HIV

AFP
Renan Sukevicius

Na esteira do plano de abstinência sexual idealizado pela ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, Jair Bolsonaro (sem partido) incluiu os cidadãos brasileiros que têm o vírus da Aids e usam do Sistema Único de Saúde (SUS) para se tratar.

Em conversa com a imprensa em Brasília na quarta-feira (5), o presidente afirmou que uma pessoa com HIV é “despesa para todos no Brasil”.

A declaração se deu durante um questionamento sobre cortes de verba em políticas para as mulheres. Bolsonaro defendeu a proposta de Damares, definida por ele como “mudança de comportamento necessária”.

Bolsonaro foi além e criticou “a liberdade” que, segundo ele, governos anteriores deram. “Se glamouriza certos comportamentos que certos chefes de família não concordam, chega a esse ponto, uma depravação total”.

A fala dá a entender que o presidente da República acredita que todos os portadores de HIV e que sentem os efeitos da síndrome de imunodeficiência contraíram o vírus porque foram promíscuos, como se isso fosse passível de punição.

Em 2016, durante a Olimpíada do Rio, eu estive no Instituto de Infectologia Emílio Ribas, referência nacional no tratamentos de doenças infectocontagiosas, na região central de São Paulo.

À época, como repórter na rádio BandNews FM, recém-formado em jornalismo e fora da cobertura olímpica, fui até um hospital para saber como os pacientes internados estavam acompanhando as competições.

Caí de paraquedas no setor de HIV/Aids e, de cara, entrevistei dois homens gays que pegaram o vírus por sexo sem proteção. E, visitando outros quartos, conversei com uma uma mulher heterossexual que pegou o vírus porque o ex-marido mantinha, sem o consentimento dela e sem proteção, relações sexuais com outras pessoas. Falei ainda com um homem heterossexual, de Dois Riachos, em Alagoas, terra da atacante Marta, naquela altura ainda em campo na olimpíada. Ele contraiu o vírus no trabalho com materiais recicláveis.

Eram pessoas comuns, com histórias de vida diferentes, que estavam sob cuidados médicos que levaram 40 anos para serem construídos. Eram brasileiros que estavam bem a ponto de conseguirem parar de pensar no tratamento da síndrome por alguns minutos e torcer pelo país na olimpíada.

Tratar os efeitos causados no organismo pela Aids custa, sim, porque o acompanhamento é eficaz, prolonga o tempo de vida de quem vive com o vírus. Tentar entender as complexidades das relações humanas e se solidarizar com quem porta o vírus não custa nada.