Fake news, condenação e divórcio: o último ano de mandato do primeiro prefeito gay do Brasil
A entrevista com o prefeito de Lins, no interior de São Paulo, ao blog estava marcada para 11h30, por telefone. No horário combinado, liguei. Bruna, sua secretária, atendeu e me avisou que Edgar de Souza (PSDB) estava em uma emergência e não poderia falar naquele horário.
O marido de uma das secretárias do município havia passado mal, e o prefeito foi até o hospital onde o homem estava internado. Em pouco tempo, me prometeu Bruna, Souza me atenderia. “Aqui é interior, é rapidinho mesmo”, me garantiu.
A ida ao hospital e a entrevista eram dois dos compromissos do tucano no dia. Administrar as repercussões de notícias (verdadeiras e, principalmente, falsas) sobre ele e sobre sua gestão é também uma outra tarefa de sua rotina e, assim como a ida ao hospital, acontece sem aviso prévio, basta uma mensagem no WhatsApp viralizar.
No dia 18 de janeiro, o prefeito fez um post em sua página no Facebook negando ser ele em uma conversa em áudio que circulou entre moradores da cidade sobre a instalação de radares de trânsito. Na rede social, Souza afirmou que entraria com uma ação por calúnia, injúria e difamação contra quem repassasse o conteúdo.
A publicação gerou comentários favoráveis e contrários. Mas um deles era uma ameaça. “Quero ver processar, eu ainda quebro a cara dele”, relembra Souza, que, ao ler a mensagem, respondeu que estava fazendo um boletim de ocorrência contra o usuário do perfil que o ameaçou.
Reconhecendo, mais tarde, que agiu de forma impulsiva, o político escreveu também que aguardava o homem que o ameaçou até as 18h na sede da prefeitura.”Queria que ele viesse quebrar a minha cara”, conta. “Tem uma hora que enche o saco, vai cansando. [As pessoas] acham que podem resolver intimidando. [Fazem isso] com mulher, com gay”.
O agressor não apareceu.
Uma tv local questionou o prefeito sobre o post, e sua resposta viralizou. “Se eu tivesse medo de homem, não dormia com um”, retrucou. Veja no vídeo abaixo:
Não é um segredo para os linenses a sexualidade de Souza, no segundo mandato seguido como prefeito. A internet, no entanto, desconhecia. O tucano já havia aparecido na imprensa nacional em 2017, quando se casou com um empresário da cidade, em uma festa para 300 convidados.
O matrimônio, me contou na conversa por telefone, terminou. Mas Souza vive um novo relacionamento, também de conhecimento público. E foi justamente uma paixão que o tirou do armário, no começo de sua vida pública, do primeiro para o segundo mandato como vereador. “Era uma tortura [não poder se assumir]”, relembra. Edgar de Souza é considerado o primeiro prefeito assumidamente gay a ser eleito no Brasil.
Mas, à exceção dos boletins de ocorrência registrados por difamação (15, no últimos dois anos, dos quais oito resultaram em retratação), o prefeito se preocupa mesmo com problemas bastante corriqueiros da vida política. Está parado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) um recurso de sua defesa em uma condenação por abuso de poder político.
Souza e seu vice, Carlinhos Daher, tiveram os diplomas cassados durante a campanha de 2016. Se os recursos se esgotarem, ambos podem ficar inelegíveis por oito anos. “Eu não trabalho com a possibilidade de ficar inelegível”, afirma o prefeito de Lins, que prospecta sair candidato a deputado estadual ou federal em 2022.