Fala de Bolsonaro sobre máscara ser “coisa de viado” é menos ofensiva do que parece
As falas de Jair Bolsonaro têm poder. Destrutivo, muitas vezes. Ecoam por dias, semanas. Os silêncios também. O Brasil democrático pôde respirar melhor durante os dias em que o presidente suspendeu suas falas à imprensa, na entrada do Palácio da Alvorada, interrompendo uma sequência de acenos bélicos aos outros poderes e ameaças de rompimentos institucionais.
Mas muito mais pelo cargo do que pela pessoa em si, as falas de Bolsonaro também constroem. Consensos, principalmente. A coluna Mônica Bergamo desta Folha trouxe nesta quarta-feira trouxe um detalhe sobre o cuidado — ou a falta dele — que o presidente vinha tendo com relação ao novo coronavírus. A máscara, item indispensável na prevenção, foi considerada por Bolsonaro como “coisa de viado”.
A publicação deste bastidor inundou a internet com críticas à fala. Mas também gerou uma onda de orgulho dos muitos “viados” do país. Não é de hoje, a palavra viado, grafada com i no lugar do e, bem coloquial mesmo, vem se ressignificando. Deixando de ser ofensa pra virar orgulho.
Nos Estados Unidos, algo semelhante aconteceu à palavra queer. Sinônimo de estranho, bizarro, a palavra passou a representar quem não se encaixa no padrão heteronormativo e binário. E hoje a letra Q integra a longa sigla LGBTQIA+.
Ser LGBT é andar de carona com a morte. As travestis têm os 35 anos como expectativa de vida e relações homoafetivas são condenadas em mais de 60 países mundo afora. LGBTs são assassinados só por serem quem são.
Assombrada pela homotransfobia e estigmatizada pela Aids, a comunidade LGBT pode considerar um presente ser associada aos uso de máscara, símbolo da vida durante a pandemia do novo coronavírus, que ceifou a vida de quase 70 mil brasileiros e brasileiras.